Esta tendência para criar em torno de mim um outro mundo,

igual a este mas com outra gente, nunca me saiu da imaginação. Teve várias fases, entre as quais esta, sucedida já em maioridade. Ocorria-me um dito de espírito, absolutamente alheio, por um motivo ou outro, a quem eu sou, ou a quem suponho que sou. Dizia-o, imediatamente, espontaneamente, como sendo de certo amigo meu, cujo nome inventava, cuja história acrescentava, e cuja figura — cara, estatura, traje e gesto — imediatamente eu via diante de mim. E assim arranjei, e propaguei, vários amigos e conhecidos que nunca existiram, mas que ainda hoje, a perto de trinta anos de distância, oiço, sinto, vejo. Repito: oiço, sinto vejo...

Conceptualização

  # Conceptualização #Soul_Insights


"The idea becomes a machine that makes the art"

"When an artist uses a conceptual form of art, it means that all of the planning and decisions are made beforehand and the execution is a perfunctory affair. The idea becomes a machine that makes the art." 

Sol Lewitt


Este vídeo é o resultado do projeto do módulo de vídeo arte que nasceu um pouco das ideias projetadas para o PMAD. 

Não tendo a parte da escrita generativa e da interatividade, apresenta já alguns elementos que poderão inspirar o projeto, nomeadamente, o som, a imagem e a ideia do escritor-máquina. Este vídeo pode ser entendido, nesta etapa da conceptualização, como uma forma de exploração de ideias, que poderão estar na base do desenvolvimento deste PMAD, considerando outras características que vão ao encontro da intenção deste projeto (mais informações sobre o conceito, podem ser encontradas aqui ). 

A idealização passa por um objetivo muito claro. De certa forma poder abstrair a pessoa que o está a contemplar do mundo real à sua volta, sendo imersa num ambiente digitalizado onde a produção de escrita é digital e generativa. Como se a própria pessoa se colocasse no “lugar do poeta”, e se sinta como tal. De alguma forma, transmitir essa sensação de que o poeta está vivo, e continua escrevendo compulsivamente. 




Sinopse

O projeto “Soul Insights” representa um artefacto em vídeo, cujo objetivo é a representação de um autorretrato, no qual foram tomadas, como ponto de partida, algumas características importantes relativamente à biografia da autora, que definem a sua forma de pensar, personalidade e influências artísticas. Nesse sentido, para um melhor entendimento do artefacto final, importa salientar algumas dessas características, nomeadamente, o contexto de vida e educacional. Com um percurso no estudo em Humanidades, o qual culminou numa licenciatura em Línguas Literaturas e Culturas, existe uma relação evidente da autora com a arte da escrita, da literatura e da poesia. Posteriormente a esse percurso, existe uma formação na área das tecnologias em informática, pelo que, um dos objetivos deste autorretrato, é representar a simbiose entre estas duas áreas, utilizando para tal, as palavras poéticas de Edgar Allan Poe, “Alone”, transmitidas por algo que será uma máquina, através de um olhar digital e de uma voz-máquina.

O poema escolhido não é aleatório, pois retrata emoções internas da autora. Através da utilização de fotografias próprias, que representam diferentes momentos no seu percurso de vida, é efetuada uma viagem no tempo por sentimentos passados, através da “voz máquina” digitalizada e do poder da palavra que atrai o espectador para uma imersão num momento de introspeção pessoal e emocional.


Soul Insights – um projeto de videoarte, poesia e fotografia


Atualmente, considerando os efeitos da evolução tecnológica, não poderemos abordar a arte sem considerar a sua vertente digital. Com a internet e as redes sociais, comunicamos através da imagem, da fotografia, de publicações online, tudo num contexto digital, pelo que, o autorretrato apresenta-se como uma forma de representação da individualidade, amplamente utilizada, através de fotografia, como por exemplo, das selfies. Desta forma criamos uma relação simbólica entre nós e o outro, tendo o digital como uma ferramenta mediadora, um ponto de comunicação e expressão entre os indivíduos. Construímos as nossas identidades   no   ciberespaço (Sobral, 2020), principalmente através das selfies, muitas vezes editadas com recurso a diversos softwares de manipulação de imagem, sendo o lado real transformado por ideais estéticos pessoais.  

Com este novo paradigma, o que “era interno e privado, torna-se externo e público” (Lévy, 1996, p.73, citado por Sobral, 2020) o que leva a que a procura pela representação pessoal perfeita seja cada vez mais uma tarefa hercúlea, tudo para satisfazer uma necessidade básica – a partilha, indo ao encontro da pertença e aceitação social. No entanto, quando falamos de autorretrato, entendemos o mesmo como uma representação do indivíduo, realizada pelo próprio, independentemente dos materiais ou técnicas utilizadas. Segundo Sobral (2020a), o autorretrato é um “olhar intimista, voltado para si mesmo, uma encenação individual que representa uma projeção pessoal do eu”, “um discurso feito na primeira pessoa, de uma autobiografia visual” (Pessoa, 2006, citado por Sobral, 2020a). Para a autora, o autorretrato também constitui uma afirmação de presença e comunicação artística, podendo assumir formas de autoconhecimento, “exteriorizando inquietações, angústias, pensamentos, influências, provocações, experiências de vida e modos de ver e sentir o mundo que só através da interligação e conexão do autoconhecimento e da introspeção do artista com a arte é possível partilhar”. 

Foi a partir desta última definição que começou a ser estruturado o objetivo do projeto Soul Insights. Com este projeto, pretende-se invocar um autorretrato emocional, robotizado, existindo uma personificação da máquina enquanto espelho do sujeito criativo. É um processo de autorrepresentação de perturbações intrínsecas à subjetividade da artista, que personifica a máquina com as suas próprias emoções, criando um dissídio do “eu”.

O objetivo de Soul Insights é satisfazer as características de um artefacto artístico enquanto autorretrato, mas por outro caminho, ou seja, não o da representação do autorretrato enquanto selfie, ou transformações de imagens do corpo ou do rosto, mas através de imagens e som, fazer uma representação da personalidade, das emoções e da face oculta e subjetiva da artista submersa no conceito de arte digital. Os desdobramentos na videoarte incluindo fotografia têm como resultado o desenvolvimento de um projeto pessoal em vídeo, onde são resgatadas reflexões provenientes de uma viagem no tempo, revivendo sentimentos passados. Um autorretrato da alma e das suas inquietações, ao invés do corpo.


Referências

Sobral, F. A., & Simões, C. F. (2020). Metamorfoses–Um projeto de videoarte e fotografia. AVANCA| CINEMA, 170-176. https://publication.avanca.org/index.php/avancacinema/article/view/113

Sobral, F. A., & Oliveira, D. M. (2020a). Vídeo experimental e autorretrato. AVANCA| CINEMA, 280-285. https://publication.avanca.org/index.php/avancacinema/article/view/126