Esta tendência para criar em torno de mim um outro mundo,

igual a este mas com outra gente, nunca me saiu da imaginação. Teve várias fases, entre as quais esta, sucedida já em maioridade. Ocorria-me um dito de espírito, absolutamente alheio, por um motivo ou outro, a quem eu sou, ou a quem suponho que sou. Dizia-o, imediatamente, espontaneamente, como sendo de certo amigo meu, cujo nome inventava, cuja história acrescentava, e cuja figura — cara, estatura, traje e gesto — imediatamente eu via diante de mim. E assim arranjei, e propaguei, vários amigos e conhecidos que nunca existiram, mas que ainda hoje, a perto de trinta anos de distância, oiço, sinto, vejo. Repito: oiço, sinto vejo...

Relatório: Conceptualização

 

Etapas da A/R/COGRAFIA: Conceptualização

 

“Quando a intenção se torna clara, o a/r/cógrafo pode reivindicar um conceito,

formular uma hipótese de investigação, uma visão de onde a intenção conduzirá,

um protótipo conceptual do trabalho finalizado.” Veiga (2020)

 

Como resultado de etapas anteriores, e resultante do processo de investigação, inspiração, gatilho e intenção, o conceito que se tem refletido relativamente a este PMAD começa a tomar algumas formas. A idealização passa por um objetivo muito claro. De certa forma poder abstrair a pessoa que o está a contemplar do mundo real à sua volta, sendo imersa num ambiente digitalizado onde a produção de escrita é digital e generativa. Como se a própria pessoa se colocasse no “lugar do poeta”, e se sinta como tal. De alguma forma, transmitir essa sensação de que o poeta está vivo, e continua escrevendo sem fim.

De acordo com este conceito, há quatro fatores que serão fundamentais. A imagem, o som, o meio envolvente e a interação.

Em termos de materiais, será necessário: mesa, cadeira, computador, headphones. A mesa não estará vazia, contendo alguns artefactos visuais que aludem ao poeta (Fernando Pessoa) e à escrita. Através desses materiais (que poderão ser quadros, livros, blocos de notas, caneta, lápis… entre outros) pretende-se captar a atração visual do público para convidá-lo a sentar-se e viver essa experiência literária imiscuída com o ambiente digital e a escrita generativa.


Em termos de som, o conceito passa por colocar sons digitais, alusivos a máquinas em funcionamento bem como o “tic-tac” das máquinas de escrever. Através desta “voz máquina” digitalizada e do poder visual da palavra nua e crua pretende-se atrair o observador para uma imersão num momento de introspeção pessoal e emocional.

Relativamente à imagem, pretende-se algo simples, que não evoque distrações, e nesse sentido, o conceito passa por utilizar todo o ecrã para apresentação do texto generativo que se for criando, tendo apenas alguns ou os botões necessários para alguma interação.


       Nesse sentido, o texto será gerado automaticamente, tendo a possibilidade de utilizar um dicionário já incorporado no programa com textos originais do poeta, isto para que o poeta-observador possa ser um heterónimo pessoano revisitado. Ou, talvez (mas com muitos ???), numa segunda proposta de conceito (a qual ainda não está inteiramente definida) haver também a possibilidade de o observador inserir texto de input que será armazenado em dicionário, e a partir das palavras colocadas, gerar novos textos aleatórios. Esta segunda hipótese confere ao projeto um pouco mais de interatividade, contudo, desvia-se um pouco a intenção pretendida de fazer reviver o poeta propriamente dito. Em qualquer um dos casos, este processo deverá ter sempre como som de “fundo”, o descrito no ponto anterior.

       Pretende-se também que o projeto permita salvar e/ou enviar por e-mail alguns textos gerados que o observador pretenda guardar. Ainda em relação a questões de interatividade, e numa tentativa de dar “vida” ao poeta, o conceito implica que o programa não execute nem crie texto algum sem que alguém esteja sentado a observar, sendo que para isso será necessário existir um ponto de deteção por visão por computador, que identifica alguém que esteja a olhar, e, nesse preciso momento, começa a “escrever” compulsivamente. É a vida do observador que passa a dar vida ao poeta digital, sendo que o mesmo incorpora o eu-máquina, sendo uma extensão dela mesma.

 

Links do DDB: Página com entradas – Conceptualização

https://ddbmsoberano.blogspot.com/p/relatorio-conceptualizacao.html 

 

Referências:

Veiga, P. A. (2020). O Museu de Tudo em Qualquer Parte: arte e cultura digital - interferir e curar. Coleção Humanitas, Centro de Investigação em Artes e Comunicação. Grácio Editor. https://repositorioaberto.uab.pt/handle/10400.2/11265